A organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece que o aleitamento materno é essencial para bebês até os dois anos de idade e recomenda que o aleitamento materno seja realizado por esse período no mínimo, já que, segundo diversas teorias de aleitamento mundial, as crianças desmamam naturalmente por volta dos dois anos e seis meses de idade (o desmame natural pode se estender até os sete anos de idade, sem qualquer prejuízo cognitivo ou alimentar para a criança). O desmame costuma acontecer, infelizmente, mais por fatores socioculturais do que naturais. A exemplo de fatores socioculturais, a pediatra Elsa Regina Justo Giugliani, do departamento de aleitamento materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), relata no texto “Desmame: Fatos e Mitos” que diferentemente do que ocorreu ao longo de milhares de anos da evolução humana, a mulher pode, atualmente, optar por amamentar ou não seu filho.
Além da escolha de amamentar ou não, há ainda influência familiar para o sucesso da amamentação, retorno ao mercado de trabalho, ainda visto como impeditivo para a amamentação (não é, apesar de atualmente as poucas políticas empresariais tornarem o processo mais cansativo), e a influência da indústria não só para que essa mulher, ainda em descoberta do que é a maternidade, retorne a ser a mulher que era antes, mas que também recorra a bicos artificiais, comprovadamente prejudicais, para que consiga viver socialmente sem que a criança dependa exclusivamente de seus cuidados. Há também a pressão social em torno da questão seio materno sexualizado, de forma que a mulher que amamenta constantemente sofre com abordagens sobre não ter sexualidade por amamentar ou por ser vulgar ao amamentar seu filho.
Não à toa, a média de aleitamento materno no Brasil é de 54 dias. Para as mães que passam da amamentação exclusiva, é importante ter em mente que a introdução alimentar é o início do desmame. O leite materno continuado em livre demanda é essencial até o um ano de idade e por isso antes desse período qualquer desmame é precoce. A partir do um ano, o leite materno passa a ser complementar em termos nutricionais, mas não em relação ao vínculo materno, seja pela sucção afetiva, seja pelo efeito analgésico da amamentação. Pelo amadurecimento da criança durante o segundo de vida e o amadurecimento da alimentação, é incomum existir desmame natural nesse período, de modo que antes dos dois anos também pode ser considerado precoce. A partir dos dois anos, o leite materno segue como complementar e ainda alimenta (e muito) a criança. Tem bicos artificiais na jogada? Então não há desmame natural, mas ocasionado pela confusão de bicos. No desmame natural, a criança, que passou por uma amamentação sem a interferência de bicos artificiais como chupeta a mamadeira e foi amamentada sob livre demanda, opta por parar de mamar. Isso porque se, em uma exceção, a criança parou de mamar após os dois anos e meio de idade e seguiu usando bico artificial, a realidade é que ela não desmamou, ela trocou o seio materno pelos bicos.
Sinais que mostram o desmame natural
1. As mamadas diminuíram? Quando a criança muda o ritmo de mamadas e passar a mamar menos, tanto em tempo de mamada quanto em quantidade de vezes em que solicita o seio, ela pode estar no (longo) processo de desmame.
2. Sono sem amamentação. Dormir sem ser amamentando ou dormir a noite toda após mamar para dormir ou ainda acordar à noite e não recorrer ao leite materno para voltar a dormir.
3. A criança não se mostra mais ansiosa quando encorajada a não mamar e concorda em fazer outras atividades.
4. Quando a criança passa a não mamar mais em locais específicos e quando ela consegue esperar chegar em casa para ser amamentada.
5. O consolo da mãe muda e a criança não pede mais para ser amamentada para lidar com a dor de algum machucado ou tombo, passando a aceitar outras formas de consolo (talvez a mãe ainda não esteja tão consolada como a criança).
6. A criança pode ficar longos períodos ou dias sem mamar, depois voltar a mamar dias seguidos, sem necessariamente mais ter um ritmo de mamadas.
7. Ao ser oferecido o leite materno, a criança opta por brincar ou por fazer qualquer outra atividade, inclusive junto com a mãe.
Se, com todos os sinais, a criança está feliz, o desmame está se desenvolvendo. Ainda que assuste a mãe, ela e a criança vão, durante esse processo, descobrir novas formas de se relacionar e estreitar o vínculo, já tão solidificado. Entre as vantagens do desmame natural, além de gerar menos estresse para a mãe e para a criança, é importante pensar que as necessidades da criança foram respeitadas. A mãe cujo filho desmama naturalmente optou por esperar que ele estivesse maduro para se desmamar. Em termos emocionais, contribui não só para uma criança menos ansiosa, mas para uma mãe menos ansiosa e mais aberta aos estágios de desenvolvimento infantil.
Como é com as mães que já passaram (ou passam) pelo desmame natural?
“Eu sou psicóloga e educadora perinatal então já tinha bem claro o quanto a amamentação era importantíssima. Atualmente, depois de ter amamentado a minha filha por 2 anos e 3 meses tenho certeza disso. Para minha experiência o mais incrível foi ver como há uma melhora significativa na resistência da criança a doenças. A questão de ser uma analgésico nas horas de dor também ajudou demais. Para acalmar os choros. Para aproximar a gente. E, claro, como fonte riquíssima de alimento. Nunca pensei que pudesse ser diferente. Aqui respeitamos muito o tempo dela e não víamos porque desmamar antes dela sinalizar que estava pronta. Na minha opinião, o desmame natural é a forma mais tranquila e com menos sofrimento. E respeita o tempo da criança que é fator indispensável para nós. Eu acho que a mãe de RN está se adaptando à todas as novas descobertas e também é uma fase extremamente desafiadora em que ficamos extremamente vulneráveis. O final da amamentação prolongada para nós foi bem tranquilo, porque tínhamos a fala como nossa aliada, já nos conhecíamos bem e estávamos mais confortáveis uma com a outra. Para mim, o desmame foi bem tranquilo por conta desses fatores. No nosso caso eu criei uma história sobre o desmame natural. Fomos contando ela por algum tempo até que se tornou realidade”.
Damiana Angrimani Bonavigo (SP), 34, mãe de Manuela, de dois anos e 11 meses.
“Amamentar é natural, é mais saudável para a mãe e para o bebê, porque é importante para o desenvolvimento da criança. É o alimento mais completo. E não existe só a amamentação, há o aconchego, o amor, o carinho, o vínculo, que qualquer outra forma de aleitamento não proporciona da mesma maneira. A amamentação prolongada é o mais respeitoso para a criança. Se você está oferecendo o leite desde que ela nasceu, se ela conhece seu seio como aconchego, como segurança, isso transpassa as fases e as idades, e você respeita o desenvolvimento natural e o apego que ela tem pelo seio e ao mesmo tempo o desapego que ela tem, que vem com a maturidade e o desenvolvimento. A amamentação prolongada é uma continuação do que traz segurança para a criança. O desmame natural acaba entrando na seara do desmame de mamíferos, porque é simplesmente algo que a mãe e o bebê vão construindo ao longo da relação. A exaustão pode ser um entrave na questão do desmame natural, porque no modo natural a criança esquece de mamar, sendo que nesse processo às vezes a criança fica 10 dias sem mamar e pode voltar a pedir. Apesar de estar em um processo de desmame, a criança pode pedir, até que ela vai se desligamento aos poucos. Para a mãe que segue exausta, ela pode conversar, explicar, pode combinar um lugar para mamar em casa, e muitas vezes a criança não vai querer parar de brincar, por exemplo, para ir mamar. A mãe pode introduzir a ideia de que o peito vai continuar disponível, mas pode haver algumas regras a serem seguidas para que ela mame - mas para serem tratativas para essa mãe exausta, não para conduzir o desmame. Se ela segue exausta, ela é uma heroína, uma mulher muito forte e incrível. Uma mulher que está se superando para dar o melhor para o seu filho, com carinho e respeito, esperando que a criança possa ter esse amadurecimento e essa percepção que existe mais que o seio materno. Eu reverencio as mães que amamentam prolongadamente e estão exaustas. É cansativo, mas é incrível. O desmame natural ainda está sendo. Meu filho mama esporadicamente, a cada três dias. Passa dois, três dias sem lembrar, aí mama e vai brincar. Não mama mais para dormir, na rua ou quando está triste. O nosso desmame está em curso, mas não está efetivado. Eu amamento desde que ele nasceu. Eu gostaria de chegar no tandem, mas não sei se ele chegará lá comigo. Ele é alérgico múltiplo, então o leite materno é essencial para a nutrição dele. Ainda está acontecendo. E, na verdade, quem está me desmamando é ele. Tem sido um processo difícil de aceitação, eu gosto muito de amamentar apesar da dor de amamentar durante a gestação. Toda vez que ele pede é como se fosse um afago no coração. Mas quem manda é ele”.
Maria Caroline Marques (DF), 38, mãe de André Felipe, três anos, e grávida da Maria Alice, de 23 semanas.
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