"Eu, como a maioria das meninas, sempre sonhei ser mãe. Mas também sonhava em ser médica, astronauta, aeromoça, jornalista. Meu pai sempre dizia que eu podia ser o que quisesse e para isso tinha que estudar muito para 'não depender de homem nenhum!' Assim, fui primeiro aeromoça, depois jornalista.
A maternidade só voltou à lista de prioridades muitos anos depois. Já tinha viajado, estudado e me transformado em apresentadora de telejornal. Samuel nasceu quando completei 33 anos e depois de uma luta gigante para que pudêssemos ser mãe e filho. Fiz duas fertilizações in vitro e muito repouso até que ele chegasse aos meus braços, dia 16 de março de 2010. E daí vi que tudo o que eu tinha planejado não fazia mais sentido. Antes eu adorava viajar a trabalho, fazer coberturas especiais, ficar 14 horas por dia dentro de uma redação. De repente, aquilo tudo não me completava como antes. E eu comecei a desatar alguns nós, dizer não, não quero trabalhar a mais, não, não aceito sair de casa quando meu filho está dormindo e só voltar quando ele já foi para a cama.
Ser mãe é desdizer o que se disse antes, como cantava sabiamente Raul Seixas. Eu achei que nada pudesse ser mais importante que o meu trabalho. Eu achei que nada pudesse ser mais importante que minha independência financeira, meu casamento, meu apartamento quitado. Mas encontrei algo mais importante que tudo isso. Meu filho.
Você pode não querer ser mãe...
...Você pode não querer abrir mão do seu trabalho, você pode não querer comer carne nunca mais. Esse é o legal de ser livre e viver em uma democracia. Eu decidi ser mãe e, nas horas vagas, ser jornalista. Depois decidi ser mãe enquanto sou jornalista e nasceu meu blog, o Ser mãe é padecer na internet, hospedado no portal do Estadão. Eu cuido do meu filho, escrevo sobre ele e sobre como uma maternidade consciente pode ser transformadora.
Essa troca com os leitores é incrível. Sempre procuro dizer coisas que gostaria que alguém tivesse me dito quando estava grávida e depois passando pelo difícil puerpério: Não deixe que roubem seu parto. Informe-se. Esqueça a maternidade da propaganda de margarina, a real é parecida com um show de heavy metal. Peça ajuda. Não dê ouvido a palpites sem fundamento. Ouça seu coração. Eu estou ouvindo o meu. E nele, meu filho está em primeiro lugar. E todas as outras coisas, também importantes, só vêm depois.
Mas ser mãe não é uma receita de bolo. Você pode querer voltar desesperadamente ao trabalho. Você pode querer jogar tudo pro alto e mudar de profissão. Ou não querer trabalhar nunca mais. Maternidade é como o Waze, aquele aplicativo de trânsito: é preciso sempre recalcular a rota. Sem vergonha. Sem medo. A minha foi recalculada. E se na trajetória não há só flores, a paisagem no caminho é linda. E compensa."
Rita Lisauskas (SP), 39, é mãe do Samuel, 5, jornalista e escreve no blog Ser mãe é padecer na internet.